quarta-feira, março 22, 2006

Contrato para o primeiro emprego

É com alguma apreensão que olho para esta proposta em França. Não porque me vá afectar de alguma forma, mas simplesmente porque me parece uma ideia perfeitamente estúpida. Para quem não sabe, a ideia é extremamente simples: antes dos 26 anos de idade as pessoas podem ser despedidas "porque sim", assim como acontece nos States. Mas os States não são a Europa, e sinceramente não nos podemos esquecer disso. Embora nos States os despedimentos sejam livres, seja em que idade for; o que ao menos é mais justo...

Agora, porque raio me parece estúpida a ideia dos senhores governantes de França?

Primeiro, porque cria um fosso de gente disposable, tipo pastilha elástica para mascar e mandar fora. Só depois dos 26 anos alguém pode ter garantias a nível de emprego, se bem que muita gente ache que não se pode dar garantias, e que isso é um erro e afins... Normalmente só diz isto quem tem o rabinho bem acente, ou uma boa garantia seja de que forma for. Porque quem anda na corda bamba, não acha muita piada não saber se no mês seguinte vai ter dinheiro para pagar as suas contas...

Segundo, porque a economia se vai aproveitar deste facto, e vai-se transferir o desemprego das pessoas abaixo dos 26 anos, para o pessoal acima dos 26 anos. Se há despedimentos livres para essas pessoas, então é mais simples usar as pessoas mais jovens como carne para canhão, usando pessoas de acordo com as suas agendas e necessidades sem assumir qualquer tipo de responsabilidades sobre elas. As pessoas acima de 26 anos já não são disposable, por isso serão menos apetecíveis para o mercado de trabalho selvagem...

Terceiro, porque continuo a achar que as pessoas não são meras despesas dentro de uma empresa ou corporação. Não se podem usar, como se fossem meros instrumentos de lucro! Agora fazes falta, agora não fazes! Isto não é assim! As pessoas têm anseios e expectativas, que são legítimos. Não é justo defraudar essas expectativas...

Há aquelas vozinhas muito bem falantes que por aí vão dizendo que as pessoas não podem ter tudo garantido, que senão irão produzir menos. Acho que passa mais p'lo nível de motivação que por táticas de medo... Claro que as táticas de medo produzem efeito mais depressa! Dar condições reais e formas de motivação sérias é mais caro e provavelmente não irão produzir os mesmo efeitos.

Serão estas algumas das razões das doenças relacionadas com o stress?... Não sei, mas não me admirava nada! Nada mesmo....

2 comentários:

francisco feijó delgado disse...

Acho que a tua posição está ancorada no passado. Não sei se o CPE vai funcionar e eu sei que o mundo não é perfeito, mas acho que vale a pena o teste.

Tu partes do princípio que toda a gente vai despedir as pessoas que emprega antes de completarem os 26 anos. As coisas não são bem assim; uma empresa que emprega esforços de formação e vê que o seu empregado é uma boa aposta vai querer certamente mantê-lo. E aí sim, vai haver uma competição saudável pela boa prestação.

Claro, eu sei que não vivo na Utopia, portanto também haverão empregadores sem escrúpulos que se vão aproveitar desta 'facilidade' e abusar dos empregados. Mas será isso que se terá de quantificar e talvez tentar controlar.

Há que perceber que o modelo do emprego para a vida acabou. Se se puder arranjar melhor estratégias do que simplesmente virarmos 180º, então experimente-se. Eu não quero o sistema dos EUA, mas o sistema europeu poderá colapsar se não se modificar.

Depois as tuas hipóteses são logo 'enviesadas': "porque a economia se vai aproveitar deste facto, e vai-se transferir o desemprego das pessoas abaixo dos 26 anos, para o pessoal acima dos 26 anos". Hoje em dia porque é que não há emprego para o jovens? Entre outras, porque não há lugares. Ora se for mais simples contratar-se jovens, as empresas tenderão a ser mais permeáveis aos jovens e a chama-los mais. Uma empresa tenderá a manter os seus quadros, pois se está sempre a renová-los vai perder em termos de experiência e saber acumulado. Depois dizes "As pessoas acima de 26 anos já não são disposable, por isso serão menos apetecíveis para o mercado de trabalho selvagem...". Mas para o mercado selvagem, como lhe chamas, nunca houve grandes escrúpulos... Fazem isso com os seis meses de período de experiência.

Finalmente, dos teus amigos e conhecidos quantos não mudaram ou pretendem mudar de primeiro emprego?

Ricardo Ramalho disse...

Testes com pessoas e as vidas delas, é coisa que não me parece muito boa... Mas ok.

Quantas empresas hoje em dia, e vamos cá ser sinceros neste aspecto, emprega grandes esforços a nível de formação? Os que venderem a alma à empresa, pode ser que vejam o contrato renovado, se não houverem problemas de contenção orçamental... Mas pronto, de certeza que existem bastantes empresas onde se apostam nas pessoas, e aí acaba por ser irrelevante qualquer lei do trabalho, porque aí o que é de facto relevante é o capital humano. Agora, eu tenho a leve impressão que são bastante mais as que não se comportam dessa forma. E aí entra o problema de ter uma lei permissiva e ultra-liberal.

Tu até podes querer mudar de emprego, ganhar mais e tudo isso. Mas depende dos riscos... Mais vale um pássaro na mão do que dois a voar. E não me venham com tretas...

Sei lá... parece-me estúpido não se querer garantir segurança, e depois ter toda a gente empenhada até à ponta dos cabelos! Quê? Escravatura disfarçada? É contraditório tudo isto...