Pode um governo desenvolver um conjunto de acções tendentes a criar na opinião pública uma imagem extremamente negativa dos funcionários públicos?
Pode, por razões estratégicas, mas não deveria. Por dois motivos: primeiro, a maioria dos aspectos negativos deve ser imputada à própria entidade patronal (Estado); segundo, a "mensagem" é injusta por revelar apenas um dos lados da apreciação.
Consideremos apenas alguns dos aspectos consolidados na opinião pública: existe um excesso de funcionários (alguns, em serviços desnecessários), são pouco produtivos ou mesmo ineficientes, ganham demasiado, têm tido emprego garantido e um sistema de protecção social muito generoso.
Os três primeiros aspectos, para além de não poderem ser generalizados a uma "massa" indiscriminada de trabalhadores, ocultam o papel activo de sucessivos governos na contratação indiscriminada, na indefinição de funções e objectivos, na ausência de uma avaliação de desempenho séria, na falta de coragem em dizer "não" em alguns processos negociais, na nomeação de altos dirigentes que até desconhecem os recursos humanos que têm de gerir. O quarto aspecto, verdadeiro, tem raízes históricas: as ditaduras sempre protegeram os servidores do Estado (designação ainda existente na entidade responsável pela protecção na doença, a ADSE).
Deverá o Governo extinguir organismos, avaliar as necessidades em recursos humanos, implementar uma avaliação de desempenho rigorosa, eliminar os subsídios indevidos e as remunerações extraordinárias que não correspondam a trabalho extraordinário? Claro que sim. Agiu bem o Governo ao harmonizar os sistemas de pensões? Claro que sim.
Então, o que é que o Governo se esquece de transmitir para a opinião pública? Três questões essenciais. Em primeiro lugar, os funcionários públicos constituem uma fonte certa de receita fiscal já que não existem declarações abaixo das remunerações efectivas ou outras formas de evasão em sede de IRS.
Em segundo lugar, os funcionários públicos pagam taxas específicas para o sistema de pensões (tal como no sector privado) e para a protecção na doença, com retenção na fonte e sobre remunerações efectivas.
Em terceiro lugar, a necessidade de aumentar a comparticipação para a ADSE é fortemente explicada pelo congelamento salarial dos últimos anos, logo pela redução da receita desta entidade. Como esta explicação não era "politicamente correcta", o Governo preferiu passar a mensagem que as despesas de saúde dos funcionários públicos não devem ser pagas pelos outros. Pois é, também muitos dos funcionários públicos não gostam de pagar impostos para os outros, sejam eles quem forem!
Autor: Manuela Arcanjo
Desculpem-me, mas isto é uma verdadeira pedrada no charco... E está tudo dito!
3 comentários:
Isto serve de resposta a muitos para os quais o bode expiatório da crise deste país está na Administração Pública. Gostava de saber se há muitos que ao saberem o ordenado de um quadro médio continuam com tais conversas. E não estou a falar de um daqueles que não fazem nada...
Sim, caros leitores do blog do Ricardo, sou FP. Há 14 anos. Tenho muito brio e orgulho no que faço. Muitos não fariam pelo meu ordenado, nem metade.
Também não estou amarga. A AP tem premiado o meu esforço. Odeio é estar constantemente a ser chamada FP como se fosse portadora de alguma doença (infelizmente para muitos, não contagiosa).
Não gosto da Manuela Arcanjo, mas há que dizer o que sinto. Só uma mulher com ovários afirma em público e contra a máquina do seu partido o que ela aqui escreve.
Bem hajam os corajosos, num país que vive eternamente a sonhar com a Primavera vendo a cada dia tombarem mais andorinhas.
A melhor parte - que é verdade - foi a de não fugirem aos impostos :)
Temos o défice resolvido! É só aumentar o salário dos FP. Ah pera... mas de onde vem o salário?!
Alguém conhece algum funcionário público que se tenha demitido?
Está tudo dito acerca dos queixumes...
Caro anónimo... seja lá quem for, não seja demagogo! Nem sarcástico! E tenha sempre a coragem de assinar algo quando transmite uma opinião. É uma questão de carácter...
Mas por acaso conheço ex-FP's que sairam por vontade própria. E qual é o problema disso? E qual é o problema de alguém se queixar? Os FP's são os bodes expiatórios desta palhaçada do déficit! Óbvio que se vão queixar! Porque se há aqueles que nada fazem, tal como no privado (também conheço histórias de coça-bolas no privado e grandes tachos... mas isso já não interessa não é verdade?....), também há aqueles que fazem. E não são os ralés que fazem as necessárias re-estruturações de serviços. É o estado, de acordo com os seus critérios, sejam eles quais forem. Altas chefias que ligam mais a interesses partidários ou sectários do que aos serviços propriamente ditos. Emagrecer a Administração Pública não é despedir pessoas, e deixar os serviços no marasmo. É optimizar processos, que é coisa pouco conhecida neste país, infelizmente.
Portanto... esqueça lá os comentários demagogos e sarcásticos! E muito mal informados também...
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